24 fevereiro, 2011




Não. Eu não costumo bater na porta. Sei que se fizesse isto daria a Eles a oportunidade de olhar pelo olho mágico, pelo buraco da fechadura ou por qualquer alguma fresta que o tão guloso olho humano encontrasse. E se me vissem?! Ah, se me vissem... Bateriam a porta bem no meu nariz! Tomados pelo medo, pelo desespero, pela dor repentina daquela ferida que fingiam ter esquecido, enfim. Por qualquer lembrança amarga - ou ainda tristemente doce - que eu possa ter deixado. Mas, justiça seja feita, a culpa não foi minha. Não fui eu quem deixou essas marcas. Eles são todos culpados. Eles nunca aprendem. Caem, retiram o pó e continuam no mesmo caminho. A velha estrada de paisagens falsas e placas do avesso. 
Mas eu já me acostumei. Tô levando na boa, é sério. Há milhões de anos eu levo na boa. Eu sou sempre o mesmo. Eu não mudo nunca. E me apresento de tantas mil e mil formas que você, às vezes, nem sequer percebe. Sente? Sente. Mas não se dá conta de que sou eu. E terá muita sorte se, algum dia, se deixar saber quem sou eu. E é por essas e outras que eu não bato mesmo na porta. Do contrário eu daria a vocês a oportunidade de permitir ou não que eu entrasse. Céus! Vocês e esse medo inútil.  Tamanho que o guardam no lugar onde se deve guardar todas as coisas grandes. Onde é o meu lugar. E viriam com nhenhenehm, pensariam seriamente, blá blá blá e terminariam por decidir não decidindo. Fingindo não me ver. Colocariam coisas falsamente mais importantes à minha frente e eu, o Amor, ficaria, mais uma vez, pra depois. E é por isso que eu não bato na porta.

2 comentários:

  1. "Por qualquer lembrança amarga - ou ainda tristemente doce"

    Eu precisei ler o seu texto duas vezes para entender ele bem... rs

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  2. Enigmas do "inevitável". O bom é que para cada um é alguma coisa, a mais ou a menos, o que importa é que é.

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